Modest Petrovitch Mussorgsky nasceu em Kerevo, Pskov (Rússia), a 21 de março de 1839. Seus primeiros estudos de música foram orientados por sua mãe, que era professora de piano. Filho de rico proprietário, entrou para escola de cadetes da Guarda em São Petersburgo (1848). No regimento de Preobrajenski, conheceu Balakirev, com quem fez os estudos da técnica musical. Após nove anos de ofício, deixou a vida militar, tornando-se discípulo de Balakirev e Dorgomijnski. Teria pertencido ao grupo dos Cinco, que inaugurou o período nacionalista na música russa.

Mussorgsky sofreu graves crises nervosas em 1858 e em 1860. A ruína da família obrigou-o a entrar para o serviço público em 1863, sendo demitido em 1867. Sem sucesso na vida artística, entregou-se ao alcoolismo. A sua ópera Boris Godunov só foi encenada, em 1874, graças à intervenção de uma cantora célebre. Sua vida, entretanto, tornou-se cada vez mais difícil, pois o compositor, além de não ter recursos materiais suficientes, era dipsômano. Apesar de readmitido, foi novamente obrigado a deixar o serviço público em 1880. Embora parecesse ter-se recuperado durante algum tempo, Mussorgsky morreu em São Petersburgo a 28 de março de 1881, de excessos alcoólicos, recolhido ao hospital militar de São Petersburgo.

Mussorgsky é geralmente colocado, por convenção dos historiadores, no famoso grupo dos Cinco, de compositores nacionalistas, que inclui Dargomichki, Cui, Balakirev e Borodin. Mas foi o próprio Mussorgsky que declarou, em notas autobiográficas, não pertencer a nenhum dos grupos musicais em voga no seu tempo, "nem pelas suas idéias musicais nem pelo caráter de sua arte".

Mussorgsky acreditava ser a arte um meio de comunicação com os outros homens e não uma finalidade em si mesma. Isso talvez explique o caráter rude de sua técnica, de tal modo que os seus companheiros de grupo chegaram a considerá-lo uma mente débil. Mussorgsky considerava, entretanto, que só os artistas-reformadores criaram as leis da arte, e que essas leis não são imutáveis. Ignorando as regras acadêmicas, a obra de Mussorgsky é a mais original da arte russa no século XIX.

Foram provavelmente as excentricidades harmônicas, que feriram os ouvidos de seus colegas, também o motivo da atração de Debussy pela música de Mussorgsky. Nesta, a harmonia é utilizada como um instrumento de expressão dramática, pois Mussorgsky foi antes de tudo um compositor dramático, inclusive em seus lieder e em suas composições instrumentais, em que a descrição programática é simples pretexto.

As obras iniciais de Mussorgsky são canções líricas e composições instrumentais de inspiração romântica, que revelam as influências de Glinka, Balakirev, Schumann e Liszt. A linguagem é ainda convencional. Mas em uma série de canções, entre 1866 e 1868, já se nota uma evolução. Ao invés de melodias líricas, essas canções são representações da fala humana, captando, com realismo perfeito, modos característicos de falar de personagens populares. Da mesma época é Uma noite no monte Calvo (1867), poema sinfônico que ultrapassa o caráter descritivo do gênero para se transformar num estudo orquestral de grande fascínio.

Mussorgsky tentou várias vezes a ópera, deixando vários projetos em esboço ou inacabados. A única realmente terminada é também a sua maior obra e a ópera nacional russa: Boris Godunov, de que o autor fez duas versões, a primeira de 1869-1870, e a segunda de 1870-1871, realizada em face da recusa do teatro imperial de São Petersburgo de encenar a primeira versão. A segunda causou ainda controvérsias e, após nova encenação mutilada em 1878, a obra desapareceu do repertório. Boris Godunov, cujo enredo é tirado da tragédia homônima de Puchkin, é uma obra de síntese, lírica e naturalista ao mesmo tempo, utilizando elementos tão diversos como a harmonia sacra eslava e o ritmo falado das canções. Os coros e os personagens populares desempenham papel de primeira importância. A ópera é uma obra-prima do realismo popular.

Além de Boris Godunov, outra ópera merece citação: Khovantchina (1872-1881), que ficou inacabada. Mas, ao invés da síntese que se observa na outra, em Khovantchina predominam os motivos líricos sobre o realismo. E a obra vale mais pelas suas partes líricas do que pelo poder dramático.

Além das óperas, deixou Mussorgsky importantes ciclos de canções: O quarto das crianças (1868-1872), Sem sol (1874) e, sobretudo, Cantos e danças da morte (1875-1877). Essa última é composta de 4 lieder que estão entre as obras mais perfeitas de Mussorgsky. Utilizando os modos da música sacra eslava o autor conferiu às canções um sabor arcaico e severo, de certo exotismo para os ouvidos ocidentais.

Embora tenha sido compositor eminentemente dramático, Mussorgsky realizou com Quadros de uma exposição (1874) uma obra-prima de sugestão poética. São peças breves para piano, inspirada por uma exposição de desenhos, de Viktor Hartmann. A obra sintetiza elementos poéticos, realísticos e humorísticos e se destaca pela originalidade de suas melodias.

A obra de Mussorgsky teve de atravessar muitas barreiras para ser reconhecida em toda sua originalidade. Entre essas barreiras está o que os seus contemporâneos julgaram ser a sua inexperiência técnica. A ópera Boris Godunov foi "corrigida" e adaptada numa versão de 1896 por Rimski-Korsakov, e foi através dessa versão que conquistou o Ocidente. Outra versão célebre de uma obra de Mussorgsky é a orquestração de Ravel de Quadros de uma exposição, que é uma homenagem à influência de Mussorgsky.

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